O IBGE divulgou na manhã de quinta-feira (30/5) o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) referente aos primeiros três meses de 2019. Como já era esperado pelo mercado, o resultado revelou uma reversão na trajetória de expansão da atividade.
O PIB, em linha com nossas expectativas e as do mercado, recuou 0,2% na passagem do 4º tri de 2018 para o 1º tri de 2019. Trata-se do primeiro recuo trimestral desde 2016. E para iniciar nossa análise, devemos destacar que há elementos que já indicavam claramente essa possibilidade de desaceleração desde 2018.
Atividade Econômica Brasileira
O ponto central, recorrente em nossos textos, é que desde 2010 o governo adotou um conjunto de políticas expansionistas para acelerar o crescimento da economia brasileira. Famílias e empresas se endividaram ao longo do período. Por conseguinte, o Estado também elevou sua dívida.
E a partir de 2015, a política econômica adotada passou a ser contracionista, com fortes ajustes fiscais. Uma política contracionista sempre se desdobra em recessão, como a história nos mostra. E foi justamente isso o que aconteceu em 2015 e 2016.
Ainda que a economia brasileira tenha crescido – mesmo fracamente – em 2017 e 2018, já estava claro que esse crescimento se dava sob bases muito frágeis. O atual governo, portanto, herdou uma bomba relógio.
Mas devemos ser equilibrados: as ações tomadas até agora não demonstraram clara intenção de recuperar o crescimento econômico. Indústria, comércio e serviços registram mau desempenho.
Somente agora, com a confirmação do tamanho do estrago e com expectativas se desenhando em torno da continuidade do cenário de desaceleração e possível recessão, é que a equipe econômica cogita estimular a economia, desta vez, com a liberação do saldo das contas ativas do FGTS.
Quais os principais destaques das Contas Nacionais?
Sob a ótica da oferta, o recuo do PIB é explicado pela retração na agricultura (-0,5%) e do setor industrial (-0,7%), parcialmente compensada pelo setor de serviços (0,2%).
Do ponto de vista da demanda, o dado trimestral teve influência do forte recuo na Formação Bruta de Capital Fixo (-1,7%), e nas exportações (-1,9%). O impacto foi parcialmente contido pela modesta alta no consumo das famílias (0,3%), do governo (0,4%) e nas importações (0,5%).
Cabe destaque para o desempenho do setor industrial. De forma desagregada, o principal motor do desempenho da indústria foi a atividade extrativa, que registrou forte queda de 6,3%, refletindo a paralisação de exploração do minério de ferro após Brumadinho (MG).
A indústria de transformação (-0,5%) continua patinando para se recompor da crise estrutural sofrida há anos, agravada conjunturalmente pela perda de dinamismo do mercado de trabalho e pela turbulência argentina.
Complementarmente, a indústria de construção civil (-2,0%), que foi um importante motor da geração de emprego e renda nos anos antes da crise e antes dos graves escândalos de corrupção, segue com dificuldades para recuperar-se dos impactos da Lava Jato e da forte recessão de 2015 e 2016.
Possibilidade de recessão?
O desempenho negativo da maior parte dos setores da economia brasileira, em especial a queda nos investimentos (medida pela Formação Bruta de Capital Fixa) colocou em evidência a possibilidade de uma recessão técnica.
Recessão técnica é o termo utilizado para dois trimestres consecutivos de queda da atividade econômica. Uma vez que o PIB caiu no início deste ano e os dados prévios e antecedentes a partir de abril indicam continuidade desse processo de deterioração, torna-se cada vez mais real um novo resultado negativo do PIB no segundo trimestre de 2019.
É necessário colocar em evidência também as manifestações de maio de 2019. Em grande medida, as manifestações trazem à tona um ambiente político hostil e polarizado que marcou as eleições de 2018.
É inevitável comparar as manifestações de 26 de maio com àquelas de 2016 que levaram ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Mesma parcela da sociedade, mesmas demandas. Mas desta vez, em prol das ações do governo.
Também é relevante destacar que o governo Bolsonaro, apesar dos baixos índices de aprovação, conta com elevado apoio popular. As manifestações do dia 26 deixaram isso em evidência, mesmo que o contingente de pessoas tenha sido menor em comparação com as manifestações do dia 15 e do dia 30.
Como o PIB do Brasil voltará a crescer?
O que mais preocupa e chama atenção, por outro lado, é a visão de como retomar o crescimento econômico. Alguns analistas e economistas acreditam que a economia vai reagir quando voltar a confiança do empresário, pois assim, os investimentos serão retomados. E isso só vai acontecer quando passar a reforma da previdência.
O consumo das famílias, apesar da existência de importante demanda reprimida, é incapaz de avançar sobre os bens de maior valor agregado, em especial pelo hiato do mercado de trabalho e pelas relevantes dificuldades no acesso ao crédito.
Neste quadro, a ausência de quaisquer estímulos que confiram dinamismo à atividade, que temos alertado há algum tempo, pesa demasiadamente sobre a recuperação. Nesse sentido, dada a lentidão da agenda de concessões e ausência de quaisquer medidas de estímulos pontuais à demanda agregada, o crescimento econômico deve ficar, neste terceiro ano de retomada, aquém do registrado nos dois anos anteriores (leia-se, abaixo de 1%).
Deste modo, mantemos projeções pouco otimistas para o crescimento econômico neste ano de 2019. Pela ótica da demanda, o consumo das famílias deve continuar fraco, o consumo do governo deve manter-se negativo (ou neutro), dado o prosseguimento da agenda de ajuste fiscal; e o setor externo, contando com desaceleração global e modesto ganho de tração nas importações, não deve contribuir significativamente para o crescimento.
No que tange o investimento privado, dada a elevada capacidade ociosa na economia, o ponto central ao estímulo do investimento é a existência de demanda efetiva, que tende a elevar a ocupação dos fatores produtivos. Logo, o baixo dinamismo esperado para a demanda deve seguir restringindo a margem de expansão do investimento privado.
Em meio a tudo isso, somente a reforma da previdência definitivamente não é suficiente para retomar o crescimento econômico.
Câmbio e perspectivas de crescimento no mercado
Os dados do PIB, portanto, confirmaram preocupante retração neste primeiro trimestre, como indicavam as pesquisas mensais de atividade.
A perspectiva de continuidade do processo de desaceleração e deterioração da economia fortalece a perspectiva de desvalorização do Real no médio e longo prazo.
Contudo, é importante destacar que a polarização política e a pressão em torno da agenda de reformas capitaneadas pela PEC da Previdência coloca o Real em um ambiente de intensa volatilidade, mas com espaço para valorização de curto prazo.
Seguimos de olho.
André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Economia Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.