Cortes de juros e petróleo puxam câmbio para cima

O economista André Galhardo avalia como os cortes de juros no Brasil e nos Estados Unidos e a redução na produção de petróleo na Arábia Saudita por conta dos ataques à Aramco impactaram o câmbio essa semana.

Nesta semana entrou em nosso radar a delicada situação política e econômica do Oriente Médio. O ataque realizado contra estruturas de refino de petróleo da Arábia Saudita trouxe um monte de incerteza.

Neste sentido, a condução da política monetária dos Estados Unidos e do Brasil ganhou novos componentes que, a princípio, não incomodaram, dadas as decisões dos dois comitês, mas, sem dúvida, pode ter encurtado o processo de redução dos juros.

FED corta mais um pouco a taxa

Federal Reserve reduziu juros mais uma vez

O comitê de política monetária do Federal Reserve System (Fed) decidiu, como se esperava, cortar em mais 0,25 pontos percentuais a taxa básica de juros dos Estados Unidos.

Após a deliberação do último dia 18, a taxa básica de juros da economia passou a ser de 1,75% ~ 2,00%, a menor taxa desde agosto do ano passado, quando a autoridade monetária estava no meio de um ajuste monetário recessivo, ou seja, aumento dos juros.

Mais que o entendimento óbvio da política monetária expansionista, a segunda redução da taxa básica de juros dos Estados Unidos em sequência nos permite intuir algumas coisas.

Primeiro: o Fed está vendo além dos recentes números divulgados acerca da saúde da economia americana, ou seja, os últimos dados sobre sobre consumo varejista, investimentos, compra de casas novas e usadas, desemprego, consumo de combustíveis, foram positivos em alguma medida, alguns até surpreendendo positivamente o mercado financeiro.

Ainda assim, o Fed acredita em uma desaceleração próxima, senão não empreenderia uma política monetária marcadamente expansionista em meio a uma das menores taxas de desemprego e consumo da história.

É verdade que o estoque de crédito ao consumidor tem subido de forma vigorosa nos últimos anos, então, alguns dos dados positivos podem estar sendo influenciados de forma insustentável, mas estão crescendo de forma robusta há algum tempo.

Em segundo lugar está a pressão política de Trump sobre Jerome Powell, o presidente do Fed.

Trump tem deixado bem claro a sua predileção por taxas de juros ainda menores que a anunciada ontem, e esse pode ser um dos elementos que explique o movimento do Fed.

De um jeito ou de outro, o banco central dos EUA vem reforçando a expectativa de uma crise para os próximos meses e/ou o acirramento de uma guerra comercial/monetária/cambial.

Spoiler: qualquer que seja o nome dado à guerra acima, em todas as versões o risco de desvalorização do Real é iminente.

Copom segue o bonde e corta também…

O Comitê de Política Monetária do Banco Central também reduziu os juros no Brasil, em 0,5 pontos percentuais, para 5,5%

Na tentativa de não perder mais oportunidades, como aquelas que havia perdido em 2014 e 2015, o Brasil tenta se aproveitar de um ambiente externo com taxas de juros menores e da baixa inflação no cenário doméstico.

Sem dúvida alguma que, a despeito de todo o trabalho realizado pelo ex-presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn e do atual presidente, Roberto Campos Neto, o que tem feito a inflação brasileira convergir para patamares historicamente baixos para padrões brasileiros é a insuficiência de demanda.

Diante de tal diagnóstico, ainda que o ambiente externo seja desafiador, com guerra comercial, tensões no Oriente Médio e Europa, o Brasil é obrigado a empreender uma política monetária mais expansionista que outrora.

O Banco Central está agindo numa tentativa ‘desesperada’ de dar tração a combalida economia nacional.

Espera-se que com a atuação do Banco Central do Brasil a economia brasileira tenha uma chance de retomada, ainda que os números de arrecadação, consumo, indústria e serviços, nos mostre que o caminho para o crescimento da economia do Brasil ainda passará por uma longa caminhada.

Apenas para não parecer simplesmente pessimista, em âmbito fiscal, não se espera resultado positivo nas contas públicas antes de 2023. Isso contando com a reforma da previdência e outras ações do governo brasileiro.

Petróleo e Arábia Saudita

O mundo todo já sabe da extensão dos danos causados pelos ataques às estruturas de refino de petróleo da Aramco na Arábia Saudita. Já sabe também sobre uma possível escalada da tensão no Oriente Médio, uma vez que autoridades do país árabe já disse ser impossível dissociar o Irã dos ataques realizados na última semana.

Acontece que, por sorte, ou não, o problema só não foi e não será muito maior em função da desaceleração da economia global.

A desaceleração da China, o aumento da produção de petróleo de países não pertencentes à Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) como, por exemplo, o Brasil e os Estados Unidos – que já são, de longe, os maiores produtores de petróleo do mundo – tem agido em favor do alívio da pressão sobre os preços da commodity.

Além disso, ficam os questionamentos acerca do aumento do custo de extração e refino por parte da Arábia Saudita, que certamente terá que investir muito mais em segurança diante desses acontecimentos.

Quem diria, a desaceleração global conteve uma especulação maior em torno do preço da commodity  e, consequentemente do câmbio, mas isso ainda não é página virada. Iremos acompanhar os desdobramentos desse episódio nos próximos dias para verificar os possíveis impactos no câmbio.

Perspectivas

O Bacen deve continuar cortando juros e isso exercerá alguma influência altista sobre o câmbio nacional.

Essa desvalorização deve ser contida porque a despeito das reduções realizadas este ano e das próximas que virão, a taxa real de juro do Brasil é muito superior à dos países desenvolvidos, ou seja, a taxa de juro no Brasil ainda é muito alta.

A guerra comercial e cambial continuam no radar e podem se agravar se a Arábia Saudita levar o conflito com o Irã adiante.

O cenário interno encontra-se mais calmo, mas as influências externas são poderosas o suficiente para demover qualquer certeza política e econômica nacional.

Câmbio desvalorizado nos próximos dias…

André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Economia Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.

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