Desvalorização cambial deve permanecer

Leia a análise de André Galhardo sobre o comportamento das principais moedas mundiais – Dólar, Euro e Libra – ao longo da semana que está terminando.

Escalada da guerra comercial, a maior suspensão do parlamento britânico desde 1945, desempenhos da economia brasileira e norte americana, grave crise do balanço de pagamentos argentino, além dos desdobramentos políticos internos, levaram a forte desvalorização cambial por aqui. O movimento deve permanecer.

Real x Dólar

Apesar de o porta-voz do Ministério do Comércio da China ter adotado um tom conciliatório em relação às disputas comerciais entre Estados Unidos e China, o que até animou os mercados e ajudou a influenciar os preços de algumas commodities, o que se sabe é que as incertezas em torno da guerra comercial devem permanecer por um período muito mais distendido.

As novas tarifas anunciadas pela China são a prova de que o processo de negociação está bem longe de terminar. Além disso, por enquanto, os dados da economia dos Estados Unidos são bastante sólidos, o que pode dar mais força e coragem ao presidente Donald Trump para desafiar Xi Jinping.

Outro elemento de menor magnitude, mas de forte impacto sobre a cotação do Real, é o pedido de renegociação da dívida Argentina e o consequente rebaixamento da nota de crédito da mesma pelas agências de risco.

Apesar de o Brasil ter uma condição internacional muito mais favorável que a da Argentina, o desgaste do nosso terceiro maior parceiro comercial, tende a abalar a cotação do Real.

O que se sabe é que daqui até outubro deste ano, quando os argentinos irão às urnas para escolher o novo mandatário do país, nada, absolutamente nada, pode reverter a tendência de queda da atividade econômica dos nossos vizinhos. Portanto, se a crise argentina se configura em instabilidade do valor da nossa moeda, é bom acostumar-se com isso pelos próximos meses.

Como reflexo dessa incerteza, desde a segunda-feira (26/8), a moeda americana saiu de R$ 4,1571 e abriu o pregão de sexta-feira (30) negociada na casa dos R$ 4,1690. O Real acumula uma depreciação de -0,29% até a abertura dos mercados. 

Real x Euro

Christine Lagarde, ex-presidente do FMI e futura presidente do Banco Central Europeu (BCE), afirmou que as políticas de afrouxamento monetário da Zona do Euro foram eficazes e que mais estímulos podem ser usados se uma crise internacional se concretizar nos próximos meses.

Lagarde assumirá o cargo apenas em novembro, mas sua fala esta semana mostram que a condução da política monetária deve ser muito similar a já vista por longos anos durante a gestão de Mário Draghi.

Com o enfraquecimento da economia Alemã e a grave crise política da Itália, a Zona do Euro está envolta a uma potencial crise pode forçar o BCE a usar uma agenda monetária ultra expansionista, cujos resultados podem ser extremamente ambíguos.

Assim, o Euro abriu a semana cotado a R$ 4,6151 e perdeu força frente ao Real, chegando a ser cotado a R$ 4,5875 no pregão de quinta-feira (28). Na abertura do pregão desta sexta, o Euro era cotado a R$ 4,6105, uma variação semanal de aproximadamente +0,1%. Em relação ao Dólar americano, o Euro perdeu 0,57% do valor era semana.

Real x Libra Esterlina

O Premiê Boris Johnson pediu e recebeu o aval da Rainha para a suspensão dos trabalhos do parlamento britânico por cinco semanas.

A intenção de Johnson é fazer com que os representantes do legislativo não tenham tempo de reverter uma saída da União Europeia sem acordo.

O prazo máximo da decisão será no próximo dia 31 de outubro e, com a suspensão o parlamento voltaria apenas no dia 14 do mesmo mês, inviabilizando seus trabalho para impedir um Hard Brexit.

Representantes do parlamento farão pressão para reverter a decisão e já se sabe que entrarão com moção de desconfiança para tentar afastar definitivamente o primeiro-ministro.

A decisão de enfrentar o parlamento teve reflexos no mercado financeiro e no mercado de câmbio.

Nesse contexto, a Libra abriu a semana cotada a R$ 5,0789 e andou de lado em relação ao Real, alcançando o patamar de R$5,0760 na abertura do pregão de sexta-feira (30), valorização Marginal do Real. Na quarta-feira (27), a Libra chegou a ser negociada R$ 5,1554, patamar que não alcançava há meses.

Perspectivas

São cristalinos como a água os problemas políticos e econômicos que rondam os países centrais e a China, e isso tem exercido muita influência sobre o câmbio brasileiro, que deve continuar respondendo com desvalorização frente ao Dólar nos próximos dias, a despeito do trabalho do Banco Central de vender dólares no mercado à vista.

A crise argentina tem sido potencialmente ruim às condições macroeconômicas brasileiras e isso deve permanecer no horizonte relevante.

Outro componente importante é o sensível desgaste das relações diplomáticas do Brasil.

A troca de farpas entre Macron e Bolsonaro, além da imagem de destruição da Amazônia tem tido uma influência sobre o Real e neste contexto, o Dólar continua avançando.

Colocaram fogo na floresta, nas relações internacionais brasileiras e no Real. Os três continuarão queimando nos próximos dias.

Seguimos de olho.

André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Economia Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.

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