Fluxo cambial e reservas internacionais: o pior já ficou para trás?

Ao olharmos para o ambiente econômico brasileiro antes da pandemia é possível ver um amplo desgaste na relação do país com o resto do mundo. 

É verdade que o volume de investimentos produtivos que ingressaram no país em 2019 não diminuíram, no entanto, quando olhamos para as demais variáveis, a situação fica bastante delicada.

O volume de recursos que deixou o país no ano passado (US$ 44,8 bilhões) foi o maior em mais de trinta anos, e colocou bastante pressão sobre o valor da moeda brasileira em relação ao dólar.

Apesar do ambiente desafiador por conta da pandemia, podemos avaliar o volume de ingressos e saídas de recursos estrangeiros do país, e entender um dos motivos que tem trazido volatilidade ao mercado de câmbio no Brasil.

Acompanhe nossa análise a seguir.

As entradas e saídas da moeda americana

Segundo o Banco Central, do início de janeiro ao dia 4 de setembro, o saldo das operações de câmbio no Brasil ficou negativo em cerca de US$ 15,7 bilhões.

No mesmo período do ano passado o saldo das operações de câmbio havia ficado negativo em US$ 7,8 bilhões. Desse modo, o saldo deste ano é 100% menor que o visto em 2019.

Esse volume é fruto de um resultado positivo vindo do comércio exterior (+US$ 32,1 bilhões) e de um saldo negativo vindo do setor financeiro (-US$ 47,976).

O volume total de recursos movimentados em âmbito do comércio exterior foi de US$ 242 bilhões, somando exportações e importações, e de US$ 709,6 bilhões do mercado financeiro, somando compras e vendas da divisa estrangeira.

É evidente que o ambiente de pandemia tem aumentado o balanço de riscos de pessoas, governos e empresas, e isso tem contribuído para a desvalorização de diversas moedas de países subdesenvolvidos. No caso brasileiro, porém, como já havíamos visto uma saída de dólares maciça em 2019, esse saldo de 2020 é um ponto de atenção para o governo e para o autoridade monetária brasileira.

O volume de reservas internacionais

Um elemento importante para amortecer os movimentos do câmbio real-dólar é o volume de reservas internacionais. 

As reservas internacionais são relevantes para dar segurança ao investidor estrangeiro, que percebe a capacidade de pagamento do país em caso de algum tipo de ataque especulativo, ou seja, uma demanda muito forte por moeda estrangeira. Também é relevante porque permite ao Banco Central agir para suavizar momentos mais agudos dentro do mercado de câmbio. Comprando moeda para inibir valorizações e vendendo dólares para impedir movimentos fortes de desvalorização do real.

Segundo o Banco Central, no dia 08 de setembro o volume de reservas estrangeiras era de US$ 357,6 bilhões, acima dos US$ 357 bilhões registrado um mês antes e dos US$ 357,1 bilhões registrados no primeiro dia deste ano.

Em setembro de 2019, o volume sob forma de reservas internacionais era 8,1% maior que neste ano. No dia 02 de setembro do ano passado as reservas somavam US$ 386,4 bilhões.

Não há nada para se preocupar com relação a esta diminuição. Primeiramente porque o volume de reservas tem aumentado desde quando atingiu a mínima em mais de uma década no final de abril deste ano (US$ 338,8 bilhões). Em segundo lugar, o volume, ainda que estivesse no patamar do mês de abril deste ano, está acima das necessidades básicas e de segurança para a economia brasileira.

O pior já ficou para trás?

Além dos efeitos da pandemia, que já são suficientemente desafiadores para o mercado de câmbio e para a economia real, nós ainda contaremos com alguns processos importantes até o final do ano.

O primeiro deles é a eleição americana. Segundo pesquisas de intenção de votos, Joe Biden, candidato democrata, está à frente do presidente republicano, Donald Trump. É importante lembrar que em 2016 Hillary Clinton também aparecia à frente de Trump, e a vitória da representante democrata naquele ano foi cogitada até as horas finais da contabilização dos votos.

Essas eleições têm mexido com o mercado financeiro e de câmbio porque Trump à frente da economia americana por mais um mandato pode significar mais tensões comerciais junto à China e à Europa, por exemplo.

Não que Biden simplesmente cessaria a guerra comercial iniciada por Trump. Para nós, esse é um movimento irreversível no curto e médio prazos, mas a presença de Biden na Casa Branca poderia significar uma relação de tensão menos conflituosa com o país asiático.

No ambiente doméstico, nós teremos um grande desafio em âmbito fiscal – a dívida bruta do governo geral deve encerrar o ano em torno de 96% do PIB – e a votação das reformas é requerida pelo mercado financeiro.

A contração ocasionada pelos efeitos da pandemia, e até mesmo pela desaceleração da economia vista antes da propagação do vírus por aqui, nos dá indícios de que a retomada da economia deve ser muito lenta e gradual, com potencial para a diminuição sensível dos investimentos estrangeiros.

Impactos no câmbio

Respondendo a seção anterior, o pior não ficou para trás, mas não há motivo para pânico. Talvez, apenas talvez, o momento mais agudo já tenha, de fato, ficado para trás, mas muitos outros desafios estão logo à frente.

A eleição americana, o fracasso em testes de vacinas e a difícil retomada econômica por aqui, são apenas alguns exemplos de que temos um caminho desafiador até o final do ano.

O avanço das reformas, a confirmação da vitória de Biden e uma vacina efetiva contra o novo coronavírus, devem trazer o dólar de volta à casa dos R$ 4,00, mas sempre que houver recuos nestas variáveis, haverá também movimentos agudos de desvalorização da moeda brasileira.

Veremos.

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