O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, discursou na abertura do Fórum Econômico Mundial na tarde do dia 22 de janeiro. Usando pouco do tempo que lhe havia sido reservado, Bolsonaro aproveitou o momento para falar sobre a mudança no pensamento do chefe do poder executivo aqui no Brasil.
Em tom patriótico, o presidente defendeu a abertura da brasileira e ressaltou que, pela primeira vez, o corpo ministerial havia sido formado por pessoas capacitadas para a atividade, diferentemente do que era feito em outros governos.
Pragmatismo e reformas
No discurso, temas como governar sem ideologia nas relações internacionais e supressão das ideias bolivarianas na América do Sul, foram novamente abordados por Bolsonaro.
Sua fala teve como pano de fundo a liberalização do ambiente econômico, diminuição do Estado na , resgate dos valores morais do país e, principalmente, a tentativa de atrair capital ao Brasil uma vez que, segundo ele, será capaz de aplicar as reformas necessárias para que o capital reconduza o Brasil à trajetória de crescimento.
Apesar de mais curto que o esperado, o discurso do presidente brasileiro foi direto ao ponto: o Brasil precisa de recursos internacionais para voltar a crescer. Com um governo de cunho liberal, pelo menos retoricamente, o líder defendeu que os empresários estrangeiros e demais governos podem confiar seus recursos à brasileira.
Os desafios para aprovação da Reforma da Previdência
Em âmbito nacional, o discurso do presidente vem sendo ofuscado pelo desenrolar das acusações sobre um de seus filhos, Flávio Bolsonaro. Recentemente eleito senador pelo PSL, Flávio está na mira dos órgãos de controle devido movimentações atípicas de assessores e de sua própria conta enquanto era deputado estadual no Rio de Janeiro.
Todos esses elementos impactam as estratégias do presidente e é potencialmente nocivo ao seu capital político. Sem capital político suficiente, Jair Bolsonaro pode encontrar dificuldades para aprovar assuntos importantes junto ao poder legislativo, como a tão esperada Reforma da Previdência.
Nesta perspectiva, o breve discurso proferido na abertura do Fórum Econômico Mundial pode ser animador ao capital estrangeiro, ao menos por estabelecer internacionalmente alguns compromissos, mas condições políticas internas podem pôr em risco algumas promessas feitas em Davos, na Suíça.
Recuo consecutivo na zona do e balança comercial japonesa em déficit
Alguns dados internacionais também foram protagonistas da agenda de eventos econômicos desta semana.
O primeiro deles é o indicador de percepção econômica da Zona do . Segundo o centro de pesquisa econômica europeu, o índice apresentou o oitavo recuo mensal consecutivo. Na leitura da média móvel trimestral, o resultado é o mais baixo desde fevereiro de 2012.
Outro resultado que também chamou a atenção foi a balança comercial japonesa, que registrou o primeiro déficit anual desde 2016. O problema não está ligado ao déficit em si, mas o porquê ele foi construído. Dados do ministério das finanças do Japão apontam para uma queda expressiva das exportações, sobretudo para a China, cujo recuo anual foi superior aos 10% em 2018.
Desaceleração da chinesa preocupa em Davos
E, deste modo, chegamos ao ponto alto da semana: China. É do gigante asiático que vêm as maiores dúvidas e preocupações. O crescimento anual do PIB em 2018 foi de 6,4%, o menor desde 1990. Apesar da euforia dos mercados financeiros asiáticos após o anúncio da intensificação da política monetária e fiscal expansionistas, o medo geral é de que a desaceleração se intensifique a partir de agora.
Indicadores de de grandes companhias internacionais apontam para uma queda brusca nos números em 2018. Esse pode ser o prenúncio de uma dificuldade mais estrutural na China. Não é demais lembrar que a China registrou um dos maiores avanços na razão empréstimos privados/PIB. Seguir uma política monetária expansionista, portanto, pode ter efeitos questionáveis.
O vice-presidente chinês, Wang Qisha, em sua participação no Fórum Econômico Mundial (o presidente Xi Jinping não esteve presente) tratou de defender nesta quarta-feira (23/01) que o crescimento chinês, mesmo com o resultado mais baixo em 30 anos, permaneceu “significativo”.
A desaceleração da chinesa preocupa em Davos. Uma desaceleração mais forte da China pode colocar o mundo em uma crise de proporções bastante alarmantes. Questionado também sobre a guerra comercial, Qisha alertou que China e Estados Unidos são indispensáveis um ao outro, em um contexto de negociação comercial entre as duas maiores do mundo.
Perspectiva de crise global
Nos Estados Unidos, os dados de vendas de residências usadas caiu ao menor nível desde novembro de 2015. Dada a importância do setor imobiliário da maior economia do mundo, esse é outro indicador que deve permanecer no radar nas próximas leituras.
Na esteira da guerra comercial, os americanos rejeitaram uma reunião preparatória sobre um possível acordo que poderia ser selado nos dias 30 e 31 de janeiro entre autoridades chineses e estadunidenses.
Apesar da tentativa dos Estados Unidos de colocar panos quentes na situação, existem informações de que a suspensão da reunião tenha ocorrido pela inércia da China no tocante a alguns assuntos que haviam sido previamente acordados.
Se após a crise financeira de 2008, o mundo pôde contar com a China crescendo extraordinariamente e com os recursos dos dos Estados Unidos e da Zona do , desta vez, os países podem não contar nem com um nem com outro, o que torna a expectativa de uma nova crise global ainda mais assustadora.
Em resumo, os desafios do presidente brasileiro vão da tentativa de desviar dos resultados da investigação sobre Flávio Bolsonaro, ao convencimento dos membros dos governos e da iniciativa privada internacional a acreditar no Brasil, justamente no momento em que o mundo observa atentamente uma possível crise que pode estourar entre 2019 e 2020.
André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.