Visão Geral
Não foram poucas as vezes que usei este espaço para falar sobre a iminente desvalorização da moeda brasileira em 2022.
Eleições, pandemia, baixo crescimento e inflação acabam promovendo um crônico e por vezes agudo processo de desvalorização do real em relação ao dólar.
Agora que já adentramos 2022, o ano-chave para a moeda brasileira, vamos avaliar as variáveis econômicas que podem agir em favor do real e quais as ferramentas à disposição do banco central brasileiro para tentar impedir a implosão da moeda nacional.
Acompanhe nossa análise a seguir.
Aumento no preço das commodities
A propagação do novo coronavírus obrigou muitas empresas a suspender seus expedientes e isso acabou produzindo uma grave crise de oferta em vários setores.
Em um dos casos mais emblemáticos da falta de insumos e matérias primas, veículos automotores tiveram suas produções suspensas depois que as fábricas de semicondutores não conseguiram acompanhar a normalização dos pedidos das montadoras.
Essa escassez relativa acabou produzindo um intenso movimento de alta nos preços de produtos básicos, como o petróleo, minério de ferro e diversas commodities agrícolas além, é claro, dos preços aos consumidores.
Além dos problemas relacionados à incapacidade de atendimento dos pedidos, o mundo viu um importante ciclo de alta no preço das commodities depois que a China e os Estados Unidos passaram a emitir sinais claros de uma incipiente recuperação econômica.
Agora, olhando para 2022 temos a seguinte situação:
- uma eventual piora na pandemia (Deus nos livre) poderia trazer mais aumento no preço das commodities. Novos picos de contágio forçariam produtores a ajustar o nível de produção – para baixo – e isso poderia criar um movimento de alta nos preços. Esse mesmo script foi visto no caso do petróleo.
- por outro lado, o controle relativo da pandemia poderia aumentar a demanda de forma abrupta, exercendo influência altista sobre o preço de diversos bens e serviços.
Como somos um importante player exportador de commodities, isso poderia ajudar no fluxo de moeda estrangeira para o nosso país.
Mais dólares chegando ao Brasil pode significar uma diminuição na taxa de câmbio, ou seja, valorização da nossa moeda.
Aumento da taxa de juros
Outra importante rota de entrada de recursos estrangeiros no nosso país é o mercado financeiro.
Sempre que uma empresa ou pessoa física estrangeira compra ativos financeiros negociados no Brasil, mais divisas internacionais entram nas contas dos bancos comerciais e do nosso Banco Central.
Se a bolsa de valores brasileira apresentar bom desempenho, é provável que mais investidores estrangeiros se interessem pelas ações listadas na B3. Isso cria um fluxo de recursos internacionais que pode ajudar a pressionar o valor do dólar para baixo.
Como você já deve ter percebido, pelo comportamento do Ibovespa será muito difícil contar com recursos estrangeiros que venham pela compra de ações, mas existem ativos que têm se tornado uma boa opção nos últimos meses, os títulos públicos.
Após alcançar o menor nível de toda a nossa história, 2% ao ano, a Selic voltou a subir fortemente depois de o Banco Central do Brasil decidiu tentar controlar a inflação aumentando o juro básico de forma vigorosa.
De janeiro de 2021 a janeiro de 2022 foram 7 aumentos que colocaram a nossa taxa básica de juros em 9,25% ao ano.
É importante ressaltar que o ciclo de aperto monetário (alta de juros) ainda não acabou. A expectativa do mercado é que a taxa Selic alcance quase 12% antes do final deste ano.
Com a Selic em alta, aumentam também as remunerações dos títulos públicos brasileiros e, consequentemente, o interesse dos investidores estrangeiros por estes “produtos”.
A alta dos juros promovida pelo banco central brasileiro pode produzir algum fluxo de recursos estrangeiros para o nosso mercado e isso pode atuar em favor do real.
Reservas internacionais
Diferentemente do que vimos na maior parte da nossa história, hoje o Brasil tem muita munição contra o que chamamos de ataque especulativo.
Ataque especulativo é a fuga maciça de moeda estrangeira por especulação. Isso pode acontecer em caso de dívida externa insustentável, baixo nível de reservas internacionais, enfraquecimento da democracia, etc.
Desde o boom das commodities visto em meados dos anos 2000, o Brasil mantém reservas internacionais que nos garantem bastante segurança contra algumas intercorrências políticas e econômicas.
Dados do Bacen mostram que no dia 3 de janeiro de 2022 as reservas internacionais somavam cerca de US$ 361 bilhões.
Apesar de existir várias métricas para avaliar se o volume de reservas em outras moedas é suficiente para garantir segurança ao país que detém esses recursos, em todas elas o Brasil se sai muito bem.
Temos volume de recursos que garantem importações por um período bastante prolongado mesmo que não sejamos capazes de produzir superávits comerciais. Temos recursos mais que suficientes para quitar obrigações em moeda estrangeira. Tudo isso, sem que haja obrigatoriedade de produzir resultados positivos nas nossas contas externas.
De modo geral, esse volume em moeda estrangeira dá munição necessária para que o Banco Central do Brasil enfrente eventos agudos de desvalorização da nossa moeda.
Perspectivas para o câmbio
A ideia aqui não é simplificar o que pode ser um grande desafio para a nossa economia, mas trazer elementos que podem nos auxiliar de alguma forma quando falamos de câmbio.
Vejamos, o primeiro tópico fala sobre o fluxo de capital para o Brasil em caso de valorização das commodities.
Ora, em 2021 o Brasil exportou cerca de US$ 61 bilhões a mais do que importou. Esse superávit comercial é o maior da história do país e mesmo assim o valor do dólar não parou de subir.
Diferentemente dos últimos anos, o resultado líquido dos investimentos financeiros também foi positivo e isso também não ajudou o câmbio.
E para finalizar, apesar das reservas internacionais, o governo não conseguiu impedir que o real perdesse cerca de 7,2% do seu valor apenas nos últimos doze meses.
É aqui que mora o desafio e é por isso que o mercado aposta tanto em uma forte desvalorização da nossa moeda em 2022. Apesar das nossas ferramentas, estratégias e de um cenário internacional relativamente benigno, em muitas oportunidades os problemas políticos falaram mais alto.
Sem menosprezar o impacto da pandemia e do aumento da taxa de juros nos Estados Unidos, é certo dizer que a cotação do dólar dependerá muito dos desdobramentos políticos domésticos nos próximos meses.
Seguimos de olho.