Nos anos 1980 e 1990 o Brasil sentiu na pele os efeitos de crises que começaram em países com condições macroeconômicas similares às nossas.
Em 2022 o mundo é outro, a maioria dos países que enfrentaram problemas nas contas externas conseguiu acumular recursos nos primeiros anos deste novo século e agora estão, até certo ponto, preparados para uma saída importante de dólares da economia doméstica.
Olhando estritamente para a economia, a guerra envolvendo Rússia e Ucrânia nos mostrará a capacidade que as reservas estrangeiras têm de evitar ataques especulativos e de garantir menor instabilidade cambial.
O que se sabe é que a crise da Rússia deve trazer efeitos nocivos até para países que não estão conectados aos conflitos.
Acompanhe nossa análise a seguir.
Infelizmente não se fala em outra coisa desde que as manifestações no Cazaquistão começaram, em janeiro deste ano, um conflito na Eurásia deve pressionar os preços dos combustíveis e isso pode ser um grande problema para a inflação global.
O Cazaquistão, segundo maior fornecedor de petróleo da Europa, é um peixe muito pequeno perto do que a Rússia representa em termos de fornecimento de energia.
Mais de 40% do gás consumidos pelos europeus têm origem russa. Na Alemanha, maior economia da Europa, cerca de metade do gás consumido vem da Rússia.
A Rússia é o segundo maior produtor de petróleo do mundo, com mais de 11 milhões de barris produzidos todos os dias. Isso representa cerca de 11% da produção global.
Não por acaso, os preços da commodity saiu de cerca de US$78 dólares o barril para mais de US$100,00 nos últimos dias do mês de fevereiro.
Essa escalada nos preços das commodities é uma das principais responsáveis pelo aumento dos preços aos consumidores ao redor do mundo. Na Zona do Euro, por exemplo, dos 5,1% de inflação registrados até janeiro de 2022, metade estava associada aos aumentos nos preços dos combustíveis.
Essa inflação persistentemente elevada tem obrigado os bancos centrais dos países desenvolvidos a antecipar a normalização da política monetária. Nos Estados Unidos, já se fala em cinco ou sete aumentos de juros ao longo de 2022 e na Europa, Christine Lagarde, terá que enfrentar os mesmos problemas com o Banco Central Europeu.
De forma muito resumida, esse aumentos de juros promovidos pelos bancos da Europa e dos Estados Unidos pode interromper, e reverter, o movimento de valorização do real visto desde o começo do ano.
Capitais estrangeiros, principalmente os especulativos, são como pequenos animais indefesos, ao menor sinal de perigo, eles correm para muito longe na tentativa de evitar o pior. Muito longe, leia-se Estados Unidos.
Essa é uma das principais preocupações dos russos neste momento, além das aspirações geopolíticas, Putin tentará impedir que o suntuoso volume de reservas internacionais – US$597 bilhões no final de 2020 – se esvazie rapidamente diante da tentativa de conter a desvalorização do rublo, a moeda local.
Entre os dias 9 e 28 de fevereiro a moeda russa perdeu inacreditáveis 27,1% em relação ao dólar norte-americano.
Para isso, o banco central russo decidiu na última segunda-feira (28) aumentar a taxa básica de juros de 9,5% para 20%.
Apesar do aumento da taxa de juros e das medidas de restrição de saída de ativos internacionais do país, o que devemos ver nos próximos meses é um uma saída maciça de recursos estrangeiros associada a um processo inflacionário importante, mesmo com a taxa de juros no maior nível em toda a série histórica disponível.
O grande problema aqui é que a instabilidade causada na Rússia pode ter consequências em outros países subdesenvolvidos como o Brasil. Um eventual calote devido ao “bloqueio” dos bancos russos, por exemplo, poderia promover instabilidade em bancos comerciais que têm forte relação com o Brasil, por exemplo.
A chance da crise econômica russa virar uma crise sistêmica é importante e já está no radar dos investidores desde que a tensão na Eurásia começou, em janeiro deste ano.
Quando o fluxo de capitais diminui por conta da rápida deterioração de uma economia emergente, é comum que os capitais estrangeiros busquem locais mais seguros para a aplicação, causando diminuição da liquidez global e jogando o dólar para cima.
Além disso, a neutralidade do Brasil em relação ao conflito pode intensificar esse movimento.
Em 1994, a economia mexicana passou por um grave problema de liquidez de moeda estrangeira. Um crônico processo de valorização do Peso mexicano e os consequentes déficits na balança comercial somaram-se à decisão norte-americana de quase dobrar a taxa de juros na ocasião, de 3% para 5,5%.
Essa combinação contribuiu para um forte ataque especulativo contra o México – fuga maciça de dólares do país – que culminou com o esvaziamento quase que completo das reservas estrangeiras do país. No início de 1994 eram quase US$25 bilhões em reservas, e no final daquele mesmo ano, mal chegavam a US$6 bilhões.
A crise foi tão grave que acabou produzindo efeitos adversos sobre quase todos os países subdesenvolvidos, como o Brasil.
Pela sequência de problemas que se sucederam à crise mexicana, o evento ficou conhecido como efeito tequila, em alusão a um porre que derrubou cada uma das economias lationo-americanas.
É importante dizer que, doze anos antes, em 1982, a moratória mexicana acabou produzindo graves problemas nas economias latino-americanas e levou vários países para o mesmo caminho.
A desestabilização da economia mexicana em 1982 levou a Argentina e Chile a anteciparem suas moratórias e tornou o cenário econômico mais desafiador do que já vinha sendo, depois do segundo choque do petróleo em 1979.
Outros dois eventos dos anos 1990 mostraram como a economia global está super conectada e como a crise em um determinado país pode influenciar vários outros países. Uma crise cambial cujo início se deu na Tailândia, em 1997, se propagou para os chamados Tigres asiáticos e acelerou o processo de declaração de moratória russa, em 1998. Como não podia deixar de ser, o Brasil também sentiu os efeitos econômicos desta instabilidade.
Mais recentemente, até mesmo as ingerências do presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, nos assuntos do banco central local, ajudaram a trazer instabilidades econômicas aqui, no Brasil.
Ao contrário do que gostaríamos, a tensão entre a Rússia e membros da OTAN tem aumentado muito nos últimos dias e isso mostra que os efeitos econômicos produzidos pela guerra devem ser prolongados.
A história nos mostra que crises em países pares do Brasil costumam produzir efeitos por aqui também.
Em 1982, 1994 e 1997, a maioria dos países da América Latina e da Ásia enfrentaram grandes turbulências nas contas externas em função do baixíssimo nível de reservas internacionais e essas crises acabaram reverberando para países que não estavam inicialmente conectados com ela.
Essa será uma crise diferente daquelas que nos acostumamos a enfrentar no final do século passado, os países com menor nível de desenvolvimento acumularam recursos estrangeiros e estão mais bem preparados, resta saber se o volume de reservas da Rússia será suficiente para aguentar o tranco.
Por aqui, o movimento da valorização do real está comprometido, pelo menos até que haja uma diminuição das tensões na Europa.
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