Com os pedidos de uso emergencial das vacinas CoronaVac e AstraZeneca, a população brasileira começou a ser vacinada no dia em que a Anvisa autorizou o uso dos imunizantes contra a Covid-19 no país, 17 de janeiro.
De meados de janeiro até aqui [começo de fevereiro], o que se viu foi uma longa disputa por vacinas acabadas e insumos para que as mesmas sejam envasadas no Brasil. Essa “disputa”, carregada de elementos políticos, podem potencialmente diminuir a efetividade da campanha de imunização contra a Covid-19 e trazer sérios problemas para a economia do país.
Acompanhe nossa análise a seguir.
O ritmo da imunização contra a Covid-19
Segundo dados da Universidade Johns Hopkins, até a metade do segundo dia de fevereiro haviam sido aplicadas cerca de 101,3 milhões de vacinas contra a Covid-19 em nível global. Esse número é bastante próximo do número de pessoas contaminadas pelo vírus desde o início da pandemia, 104,2 milhões.
O Brasil, que teve um início relativamente tardio da imunização, tem, até o momento, cerca de 2,1 milhões de pessoas imunizadas, ou seja, cerca de 2% da população global já imunizada é brasileira.
Bem, se estamos vacinando então não existem muitas preocupações acerca da retomada econômica, certo? Não é verdade. Agora que temos as vacinas precisamos avaliar se a velocidade da imunização está adequada para o país e se isso deve se traduzir em uma condição que nos permita voltar à normalidade.
Os Estados Unidos, por exemplo, têm aplicado, em média, cerca de 632 mil vacinas contra a Covid-19 por dia. Com destaque para os últimos dias, cuja velocidade tem sido mais que duas vezes maior que a média tomada entre os dias 14 de dezembro e 2 de fevereiro.
No Brasil, a média de aplicação por dia é de cerca de 125 mil, menos de 20% da velocidade de imunização empreendida pelos Estados Unidos.
No ritmo atual, precisaríamos de cinco anos para vacinar toda a população brasileira!
Por que precisa ser rápido?
Além da razão óbvia de salvar tantas vidas quanto possível, uma maior agilidade no processo de imunização contra a Covid-19 poderia conferir ao país uma retomada mais breve e mais robusta da atividade econômica.
Diversos estudos apontam para a heterogeneidade da retomada da atividade econômica no Brasil, ou seja, a forma desigual como cada um dos setores vêm se recuperando do impacto gerado pela pandemia e pelas consequentes, e necessárias, medidas de distanciamento social.
Cerca de 70% de tudo o que o Brasil produz vem do setor de serviços, amplamente prejudicado pelas medidas de distanciamento social.
Enquanto a indústria nacional apresentou recuo de “apenas” 4,5% nos últimos 12 meses terminados em dezembro e o setor agropecuário foi amplamente favorecido pela maxidesvalorização cambial vista no ano passado, o setor de serviços apresentou recuo de 8,3% de janeiro a novembro de 2020.
Essa queda pronunciada do setor de serviços implica em menos emprego, menos renda, menos consumo, menos receita para as empresas, menos arrecadação do Estado e tudo isso se organiza na forma de um ciclo vicioso sem fim.
A vacinação contra a Covid-19 no país precisa ganhar maior dinâmica, sob pena de criar uma cicatriz tão grande no principal setor da economia que comprometa o crescimento “natural” esperado após um ano de tão profunda contração.
Voltarão os investimentos?
Segundo dados do Banco Central, o Brasil recebeu cerca de US $738,8 milhões de investimento estrangeiro produtivo em dezembro de 2020. Trata-se do menor número mensal desde julho de 2016, quando os investidores estrangeiros afugentaram-se da crise política que se abateu sobre o país.
Neste caso, a análise mais justa é aquela que avalia o volume de ingresso nos últimos três, seis ou doze meses, dessa forma diminuem-se os impactos de possíveis meses com menor entrada de recursos.
Neste sentido, o volume de investimento direto estrangeiro no Brasil ficou em US$ 34,2 bilhões nos doze meses, encerrados em dezembro de 2020. Este é o menor número deste tipo de análise desde janeiro de 2010, quando o volume de recursos acumulado em 12 meses havia alcançado cerca de US$ 32,4 bilhões.
Se o principal setor produtivo do país, o de serviços, depende quase que completamente da imunização da população e esse processo parece mais moroso que o necessário para aproveitar esse começo de ano para ensaiar uma retomada econômica mais evidente, então, os investimentos continuarão diminuindo em ritmo expressivo.
Os investimentos estrangeiros estão alocados majoritariamente no setor de serviços. Para se ter uma ideia, cerca de um terço de todo o estoque de capital no país está alocado só no setor financeiro.
A despeito dos importantes lucros registrados pelos bancos no Brasil em 2020, os números indicam que o ano passado foi o pior em 20 anos para o setor.
A volta dos investimentos estrangeiros depende da capacidade de o país imunizar a sua população da forma mais célere e eficaz possível.
E o câmbio diante do avanço da Covid-19?
Se entram menos recursos sob forma de investimento no país, mais caro fica a moeda americana para os brasileiros.
Esse movimento de escassez de recursos estrangeiros pode se agravar ao passo que economias em melhor situação que a do nosso país, no que diz respeito ao controle do número de novos casos e mortes por Covid-19, podem atrair recursos que, em uma conjuntura diferente, seriam enviados ao Brasil.
As prometidas reformas não serão suficientes para criar um clima propositivo para novos negócios se nós não resolvermos o problema acima.
Conforme foi dito anteriormente, a pandemia não vai simplesmente desaparecer. Um ano de paralisação será tempo mais que suficiente para deixar marcas profundas e definitivas na estrutura produtiva nacional.
Se nada for feito, ou melhor, se continuarmos menosprezando nossos problemas, o câmbio desvalorizado será mais que o reflexo de uma taxa de juro baixa e da aversão ao risco internacional, será fruto de uma economia deixada para trás.
Veremos.