Visão Geral (168)
Na última sexta-feira (27), o presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, disse pela enésima vez que o banco central dos Estados Unidos está certo de que a inflação atual é passageira. Nesse sentido, uma mudança na postura do banco só acontecerá quando a economia norte-americana alcançar o pleno emprego.
Apesar disso, basta um pouco de aumento nos preços das commodities ou nos indicadores de inflação ao consumidor, para que o mercado fique em polvorosa, especulando a todo momento se, finalmente, o Fed vai alterar os parâmetros da política monetária e aumentar os juros ou diminuir o volume de compra de ativos (o tal do tapering).
Se gargalos produtivos e indicadores de inflação fazem o mercado se agarrar nos calcanhares do presidente da autoridade monetária estadunidense em busca de explicações, o furacão Ida e outros elementos que surgiram essa semana devem trazer grande inquietação nos próximos dias.
Quer saber o que de fato interessa nisso tudo e quais os impactos sobre o câmbio?
Acompanhe nossa análise a seguir.
Furacão Ida e o choque na economia dos Estados Unidos (231)
Começamos a semana com a notícia de que o 5º maior furacão a atingir o continente americano tocava o solo do estado da Louisiana, na costa sul dos Estados Unidos.
O fato chamou a atenção porque há 16 anos o furacão Katrina passava pelo estado deixando um rastro de destruição e cerca de 1,8 mil mortos. Foi um dos maiores, mais mortais e mais caros desastres naturais da história dos Estados Unidos.
É verdade que, tal como ocorreu com o Katrina, o furacão já foi reclassificado para nível 1, depois de ter chegado ao estado da Louisiana no nível 4, o segundo mais elevado na escala de furacões (SSHWS). Apesar disso, ainda oferece perigo às pessoas e ao funcionamento da economia.
O furacão Ida formou-se acima de uma região onde encontram-se cerca de 560 plataformas tripuladas para extração de petróleo. Segundo o Bureau Of Safety and Environmental Enforcement (BSEE), cerca de 279 plataformas foram evacuadas e cerca de 95% da produção de petróleo foi suspensa. O impacto chega a quase 2% na produção diária de petróleo, ou cerca de 2 milhões de barris por dia.
Os trabalhos devem ser retomados em breve e a produção restabelecida, mas o impacto nos preços da commodity podem produzir algum efeito sobre os preços ao consumidor norte-americano. Lembrando apenas que nos últimos 12 meses o preço da gasolina ao consumidor subiu cerca de 42%.
As intermináveis reuniões da OPEP+ sobre o nível de oferta global (161)
Soma-se ao Furacão Ida, a reunião da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e a Rússia (Opep+), que será realizada na próxima quarta-feira (10). O grupo detém aproximadamente 45% da produção mundial de petróleo, logo, suas decisões impactam diretamente os preços da commodity no mercado internacional.
Corre no mercado a informação de que o grupo deve manter inalterada a atual política de produção, que visa aumentar de forma muito gradativa e distendida o volume de produção de petróleo.
Com o impacto, ainda que passageiro, no Golfo do México e com a decisão da Opep+, é esperado que haja algum aumento no preço do do petróleo nas próximas semanas, pressionando ainda mais os indicadores de inflação nos Estados Unidos, Europa e Brasil, por exemplo.
Só na última semana, o preço do barril de petróleo Brent aumentou 5,8%. Mas o petróleo não é o único problema ligado ao aumento de preços aos consumidores. Lembra da falta de chips? Então, ela está vivíssima.
Nova onda de contágio de Covid-19 na Malásia e a falta de chips (251)
No começo deste ano, a inflação dos Estados Unidos, que teimava em ficar em patamares abaixo dos desejados pela autoridade monetária, estava em pouco mais de 1%. Seis meses depois, em julho, havia se transformado na variação de preços mais alta desde meados de 2008 e a mais alta desde 1981 se considerarmos apenas os sete primeiros meses do ano.
São muitos os motivos que ajudam a explicar essa escalada dos preços nos Estados Unidos. Parte, vem do aumento dos preços das commodities, como tem acontecido com o petróleo, e parte vem dos gargalos produtivos produzidos pela própria pandemia, como tem acontecido com os chips.
Na tentativa de conter a propagação do vírus, a maioria dos países adotaram, corretamente, medidas de distanciamento social. Entre as medidas adotadas, estavam o fechamento de diversos segmentos do setor de serviços e do setor produtivo. E é aqui que mora o gargalo a que fazemos referência.
A sensível diminuição da produção do setor industrial associada com uma retomada econômica robusta vista na China e nos Estados Unidos, levaram a falta de insumos para algumas indústrias.
Desta vez, a Malásia, grande fabricante de semicondutores, enfrenta uma nova e agressiva onda de contágio, o que certamente deve renovar as faltas de insumos para as indústrias automobilísticas.
Apenas a título de curiosidade: a falta de veículos novos gerou um boom de procura por veículos usados. Esse aumento da procura fez com que os preços de caminhões e demais veículos usados aumentassem cerca de 42% nos últimos 12 meses.
Obrigatoriedade da terceira dose da vacina contra a Covid-19 (150)
Alguns países já começaram a aplicar a terceira dose dos imunizantes contra a Covid-19. No Brasil, como a decisão cabe aos Estados, algumas pessoas inclusive já receberam a terceira dose, como é o caso das pessoas que residem no Mato Grosso do Sul, que começou a campanha na última sexta-feira (27).
Mas, afinal, o que a terceira dose tem a ver com a inflação e o câmbio?
Antes de chegar a um consenso de que a terceira dose seria inevitável ainda este ano, já havia falta de vacinas para alguns países, vide a situação brasileira.
Com a aplicação da terceira dose, deve haver uma diminuição ainda mais intensa na oferta de imunizantes em nível global. Isso pode comprometer a vacinação em países subdesenvolvidos. Essa falta de vacinas para países latino-americanos, africanos e asiáticos pode criar ou piorar os gargalos produtivos que vem exercendo tanta pressão sobre o nível de preços.
Impactos no câmbio… (182)
Por mais que o presidente e demais membros do banco central americano se esforcem em dizer que entendem que a inflação atual é passageira e que não haverá mudanças na postura do FED nos próximos meses, basta um novo indicador de atividade econômica ou de inflação ser divulgado para que o mercado já comece a colocar em dívida aquilo que foi dito dias ou semanas antes.
A cada aumento da inflação ou diminuição do nível de desemprego nos Estados Unidos, na China ou na Europa, tem início uma nova rodada de apostas sobre quando o Federal Reserve deixará essa política monetária extremamente expansionista para trás.
E a cada nova rodada de especulação neste sentido, aumenta a procura por dólares, o que leva a mais desvalorização da moeda brasileira. Neste sentido, temos dois grandes pontos de atenção para as próximas semanas:
- o impacto dos gargalos produtivos sobre os preços aos produtores e consumidores (renovado com o problema malaio e o furacão Ida);
- o desgaste político doméstico.
Os dois têm grande potencial para trazer amplas rodadas de desvalorização do câmbio real vs dólar.
Veremos.