Visão Geral
Depois de atravessar um ano turbulento, o real começou 2022 muito bem. Só em janeiro, a moeda brasileira avançou cerca de 4,8% sobre o dólar norte-americano e isso pode ser de grande ajuda para a inflação no primeiro trimestre.
Uma eventual, mas ainda distante, diminuição das tensões entre a Rússia e membros da OTAN, pode diminuir o preço do petróleo e ajudar a maioria dos países do mundo a controlar a inflação.
O problema do Brasil é que as ferramentas usadas para tentar conter o aumento dos preços são as mesmas que ajudarão a deteriorar as contas públicas em 2022.
Acompanhe nossa análise a seguir.
Os elementos da última decisão do Copom
Na ata da última reunião, o Copom deixou claro que suas principais preocupações em relação ao aumento da inflação são a deterioração das contas públicas e o aumento nos preços das commodities.
É verdade que a normalização do setor de serviços e eventos climáticos adversos também têm produzido aumentos no índice oficial de inflação nacional, mas esses dois componentes parecem estar à margem das preocupações do Bacen neste momento.
Em relação às contas públicas, a preocupação do Bacen vem das medidas eleitorais dos últimos meses: a PEC dos precatórios, o auxílio Brasil e uma eventual PEC, já apresentada pelo Congresso com apoio do Governo, que suspende a arrecadação de impostos federais sobre os combustíveis, estão no centro das atenções agora
Só a PEC dos combustíveis poderia diminuir em até R$75 bilhões a receita anual sobre combustíveis.
No entendimento do Banco Central, quanto piores forem os resultados fiscais, maiores serão também as exigências do mercado em relação à remuneração dos títulos públicos. Em outras palavras, investidores exigem mais retorno dos títulos públicos à medida que o governo aumenta o seu endividamento.
O que o Banco Central quase não fala nas suas atas é que o próprio esforço para combater a inflação via aumento dos juros implica em aumento do endividamento público.
A conta é simples, quanto mais elevados forem os juros, maiores os desembolsos do governo para pagar aqueles que detém títulos públicos. Pior que isso, juros muito elevados, como são os juros brasileiros neste momento, implicam em diminuição da atividade econômica, e essa diminuição do ritmo da economia provoca queda na arrecadação.
Aqui é a famosa escolha de Sofia. O Bacen acredita que uma deterioração das contas públicas implica em aumento dos juros, mas os aumentos de juros implicam em deterioração das contas públicas. Complicado, né?
A inflação neste início de ano
É claro que as contas públicas não são o único problema do banco central brasileiro e justamente por isso a situação é tão delicada.
Em primeiro lugar é importante lembrarmos de que o preço do barril de petróleo bateu no começo de 2022, as máximas desde 2014..
O preço do preço WTI subiu na esteira da diminuição dos estoques oficiais dos Estados Unidos e da adversidade climática que se abateu sobre os grandes estados produtores de petróleo, como o Texas.
O preço do petróleo Brent subiu pela possível guerra da Rússia, segundo maior produtor de petróleo do mundo, com os membros da OTAN. Um conflito desta magnitude comprometeria toda a cadeia de suprimento de energia global.
Além dos impactos sobre o petróleo, o aumento das tensões na Europa produziram um expressivo aumento nos preços do gás natural cujo maior produtor e exportador do mundo é justamente a Rússia.
Tudo isso tem produzido efeitos também sobre o Brasil, ademais, a política de preços da Petrobras segue a cotação do petróleo Brent, negociado em Londres.
Os preços dos alimentos também têm influenciado a inflação global. No Brasil, a diminuição da produtividade, causada pelos efeitos do La Niña, já começou a impactar os preços da soja.
Mesmo que você não coma soja, é importante se preocupar porque o aumento dos preços podem fazer com que os produtores migrem para a produção de soja no lugar em que antes seriam cultivados outros alimentos como o milho e o feijão, por exemplo.
A crise hídrica, responsável pela explosão nos preços da energia elétrica no país, e o aumento dos preços visto no setor de serviços à medida que a população volta à atividade normal, dão o tempero da inflação acima dos 10%.
Perspectivas: dólar e inflação brasileira
A valorização do real vista nas últimas semanas tem feito mais que surpreender a maior parte dos economistas, ela tem suavizado o aumento dos preços do petróleo sobre a inflação brasileira.
Só no mês de janeiro a moeda brasileira valorizou cerca de 4,8% em relação ao dólar norte-americano. Como a política de preço da Petrobras está associada ao preço do petróleo no mercado internacional, a valorização do real acaba amortecendo a forte alta da commodity.
A elevação dos preços dos combustíveis é extremamente importante para a inflação brasileira. Isso porque, das nove categorias que compõem o IPCA, a de transportes, onde estão alocados os preços da gasolina, diesel e etanol, equivale a mais de 20% do indicador agregado.
Além do amortecimento promovido pela valorização cambial, o Brasil poderá se beneficiar de uma eventual queda no preço dos combustíveis, produzida pela diminuição das tensões na Europa.
Uma inflação sob controle exigiria menor aumento das taxas de juros e, consequentemente, resultados fiscais melhores, o que, segundo o próprio Comitê de Política Monetária, seria benéfico para a ancoragem das expectativas.
Apesar de todas essas possibilidades, ainda existem riscos relevantes no curto prazo.
O inverno rigoroso no Texas fechou a maior refinaria do país e tem causado diversos outros problemas na cadeia de fornecimento de combustíveis do país.
Não há nenhuma garantia palpável de que as tensões entre a Rússia e membros da OTAN diminuirão a partir das negociações vistas na última segunda-feira (07).
Além disso, o mundo está avaliando a capacidade da OPEC em aumentar, de fato, o volume de produção nos próximos meses. Apesar dos esforços, o cartel dos países exportadores de petróleo enfrenta sérias dificuldades de produção na África e na Ásia Central.
Tudo isso ainda tem como pano de fundo um ano de eleições no Brasil e a propagação da Ômicron por todos os países do mundo.
Seguimos de olho.