Em 2020, o mundo todo foi pego de surpresa e o ano ficou conhecido pelos desafios e mudanças marcados pela pandemia do coronavírus, que provocou momentos de intensa volatilidade.
E para relembrar os principais, convidamos o Fernando Pavani, CEO e Fundador, e Alexandre Liuzzi, CSO e Co-fundador da Remessa Online, para analisar e comentar os movimentos político-econômicos de 2020.
Além disso, também convidamos o economista André Galhardo para compartilhar as suas percepções sobre os últimos 12 meses. Confira a seguir!
A pandemia foi, de longe, o assunto mais falado em 2020, mas nesta nossa retrospectiva veremos que o ano já começou de forma bastante conturbada e que seria praticamente impossível imaginar um caminho diferente do que aconteceu com o câmbio, as contas públicas e a economia de modo geral.
1º trimestre: O mundo percebe o coronavírus e o medo da terceira guerra mundial
Janeiro
No primeiro dia útil do ano, nós acordamos com a notícia de que os Estados Unidos teriam matado por meio de um drone, o general iraniano Qassem Soleimani.
Rapidamente a notícia ganhou o mundo e tão rápido quanto a propagação da notícia foi a propagação do temor de uma retaliação por parte do Irã e aliados.
No mesmo dia da morte de Soleimani houve disparo de mísseis em direção a bases aéreas americanas instaladas no Iraque.
Lembrando que em janeiro o mundo já sentia os primeiros impactos da desaceleração da economia chinesa em decorrência da propagação do novo coronavírus.
O dólar americano, que começou o mês de janeiro cotado a R$ 4,03, ganhou valor rapidamente e fechou o mês cotado a R$ 4,28.
Fevereiro
O mês foi importante, porque houve diversos atritos políticos domésticos e importantes mudanças no que diz respeito à geopolítica brasileira.
Por aqui, tivemos senador baleado em ato contra a greve de policiais militares, assassinato de ex-policial do BOPE e a troca de dois importantes ministros, sendo um deles remanejado por acusações que pesavam contra ele.
O Brasil “deixa” o status de país em desenvolvimento e passa a ser tratado pelos Estados Unidos como país desenvolvido, o que nos faz abrir mão de importantes vantagens comerciais ligadas.
A intenção do governo brasileiro era garantir a prometida vaga na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), enquanto a intenção dos Estados Unidos era aumentar o protecionismo e impedir que produtos brasileiros tenham condições melhores que os americanos.
O dólar começou fevereiro cotado a R$ 4,25 e fechou o mês a R$ 4,47.
Março
Em março a pandemia chega à realidade brasileira. Apesar de o primeiro caso ter sido confirmado em 26 de fevereiro, a situação na Itália e Irã, por exemplo, acendeu um sinal de alerta para as autoridades brasileiras.
Diante do cenário de pandemia, em março o governo federal declara o estado de calamidade pública.
Lembrando que só no mês de março, o circuit breaker – mecanismo de “paralisação” da B3 sempre que o principal índice da Bolsa o Ibovespa cai 10% ou mais – foi acionado seis vezes. O número foi mesmo visto em 2008, com a eclosão da crise do subprime, nos Estados Unidos.
No dia 31 de março, a moeda americana fechou o dia cotada a R$ 5,21, maior valor nominal de toda a história do real.
2º trimestre: auxílio emergencial, troca de ministros e mais desvalorização do real
Abril
No começo de abril o governo sancionou o que convencionou-se chamar de auxílio emergencial. A proposta inicial do Poder Executivo era de R$ 200,00 e foi alterada pelo parlamento para R$ 600,00.
A medida foi importante porque semanas antes o governo já havia publicado uma Medida Provisória que permitia às empresas suspender ou reduzir contratos de trabalho em função da quarentena imposta pelos entes subnacionais.
O mês de abril foi bastante particular para a política nacional. O presidente brasileiro se desentendeu com o ex-ministro da saúde, Henrique Mandetta e depois, com um dos principais nomes de seu governo, o ex-ministro Sérgio Moro, que deixou o Ministério da Justiça e acusou o presidente de ingerência nos assuntos da Polícia Federal.
Na semana em que Moro deixou o governo o dólar avançou de R$ 5,32 para 5,59. Neste momento, o real já acumulava “títulos” diários de moeda com maior desvalorização em nível global.
Neste mesmo mês tivemos contratos futuros de petróleo com valores negativos diante da paralisação das economias atingidas pelo novo coronavírus.
Maio
Em maio os problemas políticos permaneceram muito vivos no nosso cotidiano.
O governo decidiu trocar, pela segunda vez, o Ministro da Saúde, desta vez foi Nelson Teich que abandonou o governo após a insistência do uso de medicamentos que não tinham eficácia comprovada no tratamento da Covid-19.
Teve a divulgação da reunião ministerial e um desgaste crônico do presidente com a mídia brasileira, mas para além dos acontecimentos domésticos, tivemos, em maio, muita coisa jogando contra o real em nível mundial.
Maio foi o mês em que as manifestações antirracismo ganharam força nos Estados unidos, após o assassinato de George Floyd no estado de Minnesota.
Além da importância óbvia dos protestos, ele teve também importância em âmbito político. Trump passou a perder apoio popular em regiões importantes, onde já havia um desgaste da sua imagem por negar a importância da pandemia.
Nossos irmãos bolivianos passaram por um momento político bastante conturbado e a Argentina estava em meio a uma das maiores crises econômicas e sociais dos últimos anos.
No quinto mês do ano, a moeda americana continuou a avançar sobre a divisa brasileira e chegou a ser cotada a R$ 5,97. No entanto, o real reverteu parte do movimento de desvalorização e fechou o mês em R$ 5,34, depois de ter começado o mês em R$ 5,49.
Junho
No mês de junho o Brasil continuou com problemas políticos e mais ministros deixaram o governo naquele mês.
A moeda americana fechou o mês de junho cotada a R$ 5,46.
3º trimestre: a nota de R$ 200,00 e a debandada dos homens de Guedes
O terceiro trimestre marcou uma certa “virada” na situação brasileira. Foi nele que, finalmente, pudemos observar uma diminuição lenta e bastante gradual da média móvel de mortes e de novas infecções por coronavírus.
No entanto, também foi nele que assistimos a mais desgastes políticos e acontecimento relevantes que se desdobraram para a esfera econômica.
Julho
Primeiro houve a clara intenção de acabar com a lava-jato. A frase com este teor foi inicialmente dita pelo Procurador Geral da República e depois endossada pelo presidente brasileiro.
A propósito, foi no mês de julho que o presidente brasileiro contraiu a Covid-19 o que gerou intensa movimentação por parte de políticos e da imprensa, cada qual com sua sentença acerca da situação pela qual passava o chefe do poder executivo nacional.
Em âmbito internacional, após intensos protestos em Hong Kong, a China conseguiu finalmente emplacar a lei de segurança no território. Os protestos em Hong Kong acabaram se tornando uma grave ameaça ao governo chinês, haja vista o passado turbulento do país quando o assunto é manifestação.
Apesar do avanço dos problemas ligados à chamada guerra comercial entre China e Estados Unidos, no mês de julho a moeda brasileira apresentou algum processo de valorização. Em 31 de julho o dólar americano valia R$ 5,22.
Agosto
O mês de agosto, ainda mais intenso que o primeiro mês do terceiro trimestre, foi marcado por grande movimentação política. Uma parte importante da equipe do Ministro da Economia, Paulo Guedes, deixou o governo e enfraqueceu a imagem do ministro.
Àquela altura, funcionários do alto escalão e ministros que eram peças-chave, já haviam deixado seus cargos e o mercado temeu pela saída de Guedes.
No exterior, apesar da explosão no porto de Beirute, capital libanesa, comover o mundo todo, tal acontecimento não impactou no funcionamento dos mercados financeiro e de câmbio.
A desintegração da equipe e imagem de Guedes em agosto conferiu importante desvalorização da moeda brasileira. O dólar americano fechou o mês cotado a R$ 5,49.
Setembro
Foi em setembro que nós conhecemos, de fato, o impacto da pandemia sobre a economia nacional. O PIB brasileiro recuou 9,7% no segundo trimestre e estamos certos de que o tombo seria muito maior sem a presença do Estado com os mecanismos de atenuação dos efeitos da pandemia.
O lançamento da nota de R$ 200,00 em face do aumento da demanda por dinheiro acendeu a luz amarela dos desavisados. Teve até gente importante confundindo causa e consequência, avaliando – equivocadamente – que cédula maior elevaria a inflação.
O dólar americano fechou o mês de setembro cotado a R$ 5,61.
4º trimestre: segunda onda de covid-19 e Joe Biden eleito
Outubro
O mês de outubro marca o início de uma nova onda de infecções pelo novo coronavírus na Europa. Não à toa a Alemanha, França, Itália e Bélgica, por exemplo, retomaram medidas de isolamento social.
Apenas para efeitos comparativos, na chamada segunda onda, que ainda – em dezembro – está acontecendo, o pico de casos diários na Alemanha ficou acima dos 23 mil.
Na primeira onda o maior registro de casos diários havia sido de pouco mais de 6 mil. na Itália, França, Itália e França, os registros indicam o mesmo movimento, aumento desproporcional do número de casos na segunda onda.
Se você estiver se perguntando porque falamos tanto do novo coronavírus, aí vai a resposta. A propagação do vírus exige medidas de distanciamento social que impactam diretamente no faturamento das empresas.
A pandemia e as medidas de contenção aumentam o que chamamos de balanço de riscos, tudo isso fortalece a fuga para o dólar. Resumidamente, o coronavírus ajudou e intensificou o processo de desvalorização da moeda brasileira, movimento que já era visto muito antes de 2020 começar.
Foi no mês de outubro que o Brasil atingiu o número de 150 mil mortes em decorrência do novo coronavírus, mas até meados do mês a tendência era de baixa tanto de mortes quanto de novas infecções.
Falando em Covid-19, foi em outubro também que o presidente dos Estados Unidos contraiu a doença e levantou suspeitas sobre o seu real estado de saúde.
A infecção veio em péssima hora para Trump. As eleições se aproximavam e, segundo as pesquisas de intenção de votos, havia uma importante resiliência na diferença a favor de Joe Biden.
O dólar fechou o décimo mês do ano cotado a R$ 5,75.
Novembro
O mês de novembro foi muito importante porque o mundo conheceu o novo presidente americano. Joe Biden, do partido Democrata, venceu as eleições com larga vantagem em número de votos e com relativa vantagem no número de delegados.
Como Biden venceu em função de “virar o jogo” no decorrer da apuração dos votos, sobretudo nos Estados de Michigan, Wisconsin, Minnesota, Pensilvânia e Geórgia, o atual presidente tem tentado, a todo custo, provar que as eleições foram fraudadas em favor do seu opositor.
O fato é que a vitória de Biden e alguns dos novos da equipe de governo já anunciados pelo democrata, trouxeram esperança de que os pacotes de estímulos fiscais sejam viabilizados pela Janet Yellen ou ainda que a guerra comercial com a China ao menos diminua de intensidade.
O resultado das eleições americanas somados a resultados positivos de testes clínicos de potenciais vacinas contra o coronavírus animaram o mercado financeiro e a moeda americana fechou o mês passado cotada a R$ 5,33.
Dezembro
O mês de dezembro continua com o mesmo clima do encerramento de novembro e o mercado tem reagido bem às escolhas de Biden e aos resultados das vacinas contra o novo vírus.
Parece que terminaremos o ano bem melhor do que começamos, mas é melhor aguardar os próximos dias porque no segundo dia de 2020 já tínhamos a ameaça de uma terceira guerra mundial.
Veremos.