Visão Geral
O Comitê de Política Monetária decidiu reduzir a Selic em 0,75% e colocou a taxa básica de juros no menor nível da história brasileira. De novo.
O mercado agora se pergunta como isso pode afetar os negócios no Brasil e de que modo remunerações menos atrativas dos títulos públicos brasileiros podem impactar o câmbio e as contas externas brasileiras.
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Não é um exercício fácil. Estimar a taxa de câmbio, mesmo em um ambiente relativamente tranquilo, é uma tarefa bastante desafiadora. Contudo, é possível identificar as variáveis que impactaram o câmbio em uma espécie de “engenharia reversa”. E, a partir disto, extrapolar o comportamento da moeda brasileira à luz das variáveis identificadas.
Acompanhe.
É tudo culpa do novo coronavírus?
A primeira coisa que precisamos nos ater é de que os nossos problemas não se resumem à crise do novo coronavírus.
É verdade que a propagação da doença pelo mundo intensificou alguns movimentos que já eram percebidos muito antes do primeiro caso de Covid-19 vir à tona na China, em dezembro do ano passado.
Também é verdade que problemas novos surgiram a partir do desmantelamento do sistema econômico global. Com a desaceleração da China, Europa e Estados Unidos, estava claro que nós enfrentaríamos novos “inimigos”.
A prova de que já enfrentávamos problemas está justamente na cotação da nossa moeda.
A cotação média do dólar, em janeiro de 2019, foi de R$ 3,74. Em novembro do ano passado, a cotação atingiu o recorde nominal de R$ 4,26. E fechamos 2019 com a moeda estadunidense cotada a R$ 4,01.
Portanto, o movimento de forte desvalorização do câmbio já estava presente antes da chegada do novo coronavírus à Europa, China, Estados Unidos. E Brasil, claro.
A desvalorização da nossa moeda teve como pano de fundo a maior saída de dólares da economia brasileira vista em 38 anos. Foram US$ 44,7 bilhões retirados do país em apenas doze meses – muito mais que o recorde anterior de US$ 16,2 bilhões, em 1999, quando o Brasil abandonou o regime de taxas fixas de câmbio.
Bem, o câmbio acaba por refletir a situação mais geral da economia. Se a economia, e a política, vão bem, o que normalmente se vê é uma valorização da moeda doméstica em relação ao dólar. No entanto, desse ponto de vista, 2019 e 2020 já eram desafiadores antes das quarentenas.
A economia brasileira pré-coronavírus
Ao olhar um pouco mais ao passado, em 2017, primeiro ano de crescimento da economia pós-crise 2015-2016, o IBGE registrou o crescimento de 1,3% da nossa economia. No ano seguinte, em 2018, após algumas expectativas frustradas, e por ter sido um ano delicado em decorrência das eleições presidenciais, o país cresceu os mesmos 1,3%. Tudo isso com muita liberação de FGTS e ações pontuais dos governos.
Por fim, em 2019, ano em que algumas pessoas, empresas e consultorias demonstraram certo otimismo acerca de eventual pujança da economia, decepcionaram-se ao observar o crescimento de apenas 1,1%. Cabe ressaltar a desaceleração vista no último trimestre do ano.
A despeito da relativa melhora das contas públicas nos últimos dois anos, esse movimento se deu às custas de receitas extraordinárias. Mesmo o Senado Federal expediu relatórios que apontam um resultado fiscal positivo só a partir de 2026.
Na atual conjuntura, com a propagação do novo coronavírus, o cenário mudou e a expectativa é de superávit somente em 2031.
No começo de 2020, quando a Covid-19 parecia uma ameaça controlada, restrita à China e um pequeno grupo de países do sudeste asiático, o Brasil já apresentava dados que mostravam que seria um ano desafiador. Em suma, antes mesmo do novo coronavírus, a economia brasileira já vinha em uma trajetória bastante delicada.
Selic menor: os dólares vão embora?
Nos últimos dias 5 e 6 de maio, o Banco Central do Brasil tinha algumas opções. Um dessas opções era manter a taxa básica de juros inalterada na tentativa – inócua – de manter a remuneração dos títulos públicos mais atrativas para o mercado.
Esperava-se, com isso, estimular a apreciação da nossa moeda. Ou ainda, no pior dos casos, pela manutenção da taxa de câmbio em um patamar estável.
Percebam a ênfase em que essa hipótese seria inócua. Isso ocorre justamente porque não se trata apenas de um movimento que envolve o Brasil e os Estados Unidos. Não é suficiente tornar ou manter no Brasil um atrativo financeiro em um momento em que a aversão ao risco cresce de forma abrupta em todo o mundo.
A conjuntura atual exige de investidores e empresas a busca por um porto seguro. As pessoas estão desfazendo posições e recorrendo a ativos financeiros com o menor risco possível – daí o “privilégio exorbitante” do Dólar em ação. Portanto, é um movimento global.
Uma coisa é tentar reverter a desvalorização do real, outra, é tentar impedir a valorização do dólar.
A despeito da delicada situação política pela qual o Brasil atravessa que intensifica os movimentos cambiais vistos aqui, na verdade, a atual é reflexo de um movimento global, que não poupará nenhum país subdesenvolvido – ou, como se convencionou chamar, país emergente.
Então, para além da redução da taxa de juros, o “recado” emitido pelo Banco Central do Brasil é de comprometimento em atenuar os efeitos do novo coronavírus no país. Na breve nota veiculada após a reunião do Copom em 6 de maio, o Banco deixou em aberto a possibilidade de mais um corte de até 0,75% na próxima reunião.
Impactos no câmbio e Perspectivas
O movimento do Banco Central é justamente mais uma ação que busca reforçar o comprometimento em minimizar os impactos da crise, em outras palavras, de que o Brasil pode sair mais rapidamente da condição em que se encontra.
A saída de dólares e a sua consequente apreciação, por outro lado, já era um movimento visto muito antes da chegada do vírus ao Brasil. E essa deve ser a tendência nos próximos dias, quiçá próximos meses.
Salvo por ações pontuais do Banco Central no mercado de câmbio e algumas boas notícias acerca do novo coronavírus, a tendência permanece, portanto, pela desvalorização da moeda brasileira. E pasmem: a culpa não é da Selic a 3%.
Veremos.