O dólar americano tem se enfraquecido nas últimas semanas. Como resultado deste movimento, o Real tem registrado maior valorização. O principal motivo por trás da valorização cambial no Brasil vem dos sinais que o novo governo tem emitido para a população, de modo geral.
Novos presidentes dos bancos públicos, as declarações do Joaquim Levy relacionadas ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), além da virtual força que o governo disporia junto ao Congresso Nacional para aprovação de reformas importantes e necessárias, como é o caso da Reforma da Previdência, são exemplos de elementos importantes que pautaram as expectativas de investidores nestes primeiros dias.
Nos bastidores, a cada momento fica mais evidente a possibilidade de reeleição de Rodrigo Maia para a Câmara dos Deputados. Isso seria uma peça importante no quebra-cabeças do novo governo, uma vez que Maia é um político experiente e com a mesma pauta de interesses do Executivo.
Esse entendimento de que o governo teria amplo capital político para, enfim, realizar as reformas pode ser bastante questionável, obviamente. Mesmo com apoio de Maia. Os problemas que surgiram depois que vieram à tona os relatórios da COAF podem fazer com que o presidente perca parte de seu precioso capital político.
A despeito dos problemas de início de governo, Bolsonaro parece encontrar um ambiente de coesão significativo que coloca como possíveis as aprovações das reformas e, consequentemente, coloca mais força na moeda nacional.
É fundamental evidenciar essa sutil mudança de eixo neste início de ano. Até poucas semanas atrás, boa parte do movimento cambial estava ancorado no cenário externo, o que era inclusive esperado, dadas as incertezas advindas do ambiente externo e da guerra comercial.
No entanto, o fato de atribuir ao cenário local a maior influência cambial não se dá por um movimento atípico. O dólar tem perdido força frente aos seus principais pares. Yuan, Euro, Libra Esterlina, Franco Suíço, Dólar Canadense e outras têm mostrado vigor frente à moeda norte americana.
Além disso, é possível atribuir parte do movimento de alta ao cenário interno, em função de o Real ter ganhado força em relação às moedas dos principais países emergentes. Até o dia 9 de janeiro, o Real teve a maior valorização desde outubro do ano passado.
Nós consolidamos esse movimento no Índice de Câmbio da Análise Econômica (IC-AE). É importante observar que a queda do índice mostra valorização do Real frente às moedas dos países emergentes.
Sob a ótica do Dólar, a perda de força da moeda norte-americana acontece em meio aos resultados do shutdown nos EUA. O governo está paralisado desde o dia 22 de dezembro e já chega ao seu segundo maior shutdown da história (o primeiro maior foi no governo Clinton, em 1995, que durou 21 dias). Somado a isto, ainda temos mais declarações do presidente Donald Trump referente à taxa de juros.
A Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, agora de maioria do Partido Democrata, não quer aprovar o financiamento ao governo. O ponto central é que no texto do orçamento estão incluídos os recursos para a construção do muro na fronteira entre Estados Unidos e México. E a maioria Democrata não compactua com o pensamento do presidente Trump e de parte dos Republicanos que apoia o muro.
Para deixar as coisas ainda mais voláteis, nesta semana Trump escreveu no Twitter que os Estados Unidos estavam crescendo de forma muito robusta. E como é esperado em suas declarações, Trump ainda “alfinetou” novamente o Fed. O presidente estadunidense disse que o crescimento seria ainda melhor se a taxa de juros estivesse perto de zero como aconteceu em outros governos, fazendo referência à política monetária empreendida durante o governo de Barack Obama.
Apesar das influências negativas ligadas à paralisação do governo dos Estados Unidos e às rusgas de Trump com o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, o mercado tem reagido bem por uma série de outras razões.
Um dos principais motivos está ligado à possibilidade de um desfecho positivo na guerra comercial entre Estados Unidos e China. Alguns analistas passaram a apostar em um cenário mais benigno no que diz respeito às tensões sino-americanas. No mesmo dia em que usou o Twitter para falar da taxa de juros dos Estados Unidos, Trump usou a mesma rede social para dizer que as conversas com a China iam muito bem.
Essa possibilidade de um desfecho mais suave para a guerra comercial se refletiu no mercado internacional, trazendo alívio para a cotação das moedas dos países emergentes e mantendo a cotação das principais commodities praticamente estáveis nos primeiros dias desta semana. Infelizmente, o humor do mercado pode mudar com uma simples declaração do presidente dos Estados Unidos via rede social.
Ainda assim, existem mais motivos para acreditar na continuidade de uma valorização do Real frente ao Dólar nos próximos dias. Esse movimento, entretanto, pode não ser tão duradouro. A China, por exemplo, iniciou 2019 com dados pouco animadores. O Purchasing Managers Index (PMI) industrial da China caiu ao menor nível desde junho de 2017, com o dado abaixo dos cinquenta pontos em pela primeira vez em 19 meses.
Isso significa que a indústria chinesa, importante motor do crescimento do gigante asiático, vem perdendo força. Além disso, passado os problemas com o orçamento da Itália junto à Comissão Europeia, agora são dados importantes da Alemanha que vêm se apresentando muito abaixo do que esperavam a maior parte dos analistas.
Primeiro, o dado atinente ao PIB do terceiro trimestre veio negativo. O recuo trimestral do PIB é o primeiro desde 2015 e apesar de explicações contábeis relevantes, o número gerou certa preocupação no mercado internacional.
Agora, os dados ligados à produção industrial alemã ficaram no nível mais baixo desde novembro de 2012 na variação trimestral móvel e chegou a recuar 1,9%no mês de novembro na comparação mensal, mostrando que a maior economia da Europa pode estar com problemas.
Dados sensíveis da União Europeia e da China devem arrefecer um movimento de alta maior de Real e, dependendo do andamento do jogo político em âmbito nacional, é possível que vejamos uma reversão mais breve que se possa imaginar agora.
Via de regra, portanto, o ambiente externo continua nebuloso, mas nada que o mercado já não tenha precificado. Assim, no jogo de forças que afetam as expectativas dos agentes e a taxa de câmbio, as perspectivas com o desempenho das reformas no Brasil seguem como maior força condicionante do movimento de valorização cambial. Isso se Trump não causar uma reviravolta pelo Twitter.
Seguimos de olho.
André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Economia Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.